Inventar um Corpo: Schreber e sua Metáfora Delirante

Autores

  • Carlos Eduardo Rodrigues Faculdade PITÁGORAS
  • Júlio Eduardo de Castro Universidade Federal de São João del-Rei

DOI:

https://doi.org/10.5020/23590777.16.3.70-83

Palavras-chave:

psicose, foraclusão do nome-do-pai, metáfora delirante, corpo, invenção

Resumo

Este artigo aborda a construção da metáfora delirante de Schreber, o surgimento do significante “mulher de Deus” e os pontos nos quais ele vivencia transformações em seu corpo por meio dos fenômenos elementares, mais especificamente suas alucinações e delírios. Pretende aí articular a evolução de seu delírio com a invenção de um corpo que possa ser gozado e que lhe permita se nomear. O corpo, segundo a psicanálise, é atravessado pela linguagem, não é o corpo biológico e, por isso mesmo, é marcado pelo significante. Na psicose, o acontecimento do corpo vem como uma resposta a algo que ultrapassa o sujeito, pois o significante aí se corporifica como gozo do Outro. Os acontecimentos de corpo na psicose são efeitos da foraclusão do Nome-do-Pai, significante que, por estar incluído fora, no máximo mantém o Imaginário fragilmente atado ao Real e ao Simbólico por meio das ‘bengalas imaginárias’. Essas são recurso de compensação à amarração borromeana aí inexistente por efeito da foraclusão. Uma vez que a imagem do corpo é o suporte da relação do sujeito com o desejo do Outro, Schreber inventa o seu corpo com a imagem feminina delirada para satisfazer a Deus. E se o delírio já é uma tentativa de cura, uma invenção de um saber (S2) que vem dar sentido ao S1, pretendemos aqui esclarecer como o delírio pode servir para inventar um corpo, que na psicose está despedaçado por efeito da foraclusão. Schreber, ao consentir o gozo do Outro na figura de Deus, fez sutura em sua realidade psíquica e inventou um corpo próprio habitável. Inventar um corpo próprio foi, portanto, o modo de Schreber fazer suplência ao Nome-do-Pai foracluído. Com isso, houve uma restituição da realidade psíquica e uma contenção do gozo do Outro por meio da imagem desse corpo transmudado em corpo de mulher, restaurando assim a imagem de si e, desse modo, estabilizando seu delírio.

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Publicado

22.08.2017

Como Citar

Rodrigues, C. E., & de Castro, J. E. (2017). Inventar um Corpo: Schreber e sua Metáfora Delirante. Revista Subjetividades, 16(3), 70–83. https://doi.org/10.5020/23590777.16.3.70-83

Edição

Seção

Estudos Teóricos