Editorial
Resumo
O Dossiê “Adolescência em psicanálise, saúde mental e assistência social” constitui uma coletânea de textos advindos de um trabalho teórico comprometido com intervenções junto à adolescência em diferentes contextos no Brasil. Mobilizados por questões emergentes que marcam e atravessam vidas de crianças e adolescentes, muitas vezes propositadamente escamoteadas pela nomenclatura juventude em situação de vulnerabilidade social, os autores psicanalistas visam abrir brechas em discursos hegemônicos e totalizantes. Assim, este dossiê traz a marca ética e política da escuta psicanalítica, mesmo quando interrogada pelo campo universitário e suas diretrizes.
A efetiva participação de psicanalistas em situações de fragilidade do tecido social não é recente e os artigos, aqui apresentados, atestam o vigor de experiências que privilegiam o movimento constitutivo da psicanálise que é entre o singular do caso e o geral da teoria.
Este Dossiê conta com dez artigos que discutem a adolescência pensada pela psicanálise, bem como intervenções nos campos da saúde mental e da assistência social. A psicanálise nas políticas públicas se consolida pelo incômodo que causa quando aposta nas vicissitudes subjetivas em meio a explicações vitimizantes e culpabilizantes, bem como generalizações que retiram a complexidade do sujeito e suas possibilidades.
Os artigos de Fernanda Guimarães Pougy e Angélica Bastos Grimberg, de Veridiana Alves Costa e Maria de Fátima Vilar de Melo, intitulados, respectivamente, “Despertar para a alteridade do corpo nas mutações da adolescência” e “A carência de fronteiras na adolescência da atualidade: o adolescente em pane?”, apresentam discussões complexas sobre o adolescer para a psicanálise, tendo como norteadores Freud e Lacan. Na esteira das questões abertas pelos dois primeiros textos, Andréa Guerra e Mariana Aranha, no escrito “Guerra, tempo e memória: duas notas sobre a mortalidade juvenil brasileira”, apresentam a calamidade que é a mortalidade de jovens no nosso país tomando como mote o diálogo entre psicanálise e antropologia, hipotetizam que a “busca” por uma inscrição de uma escrita marginal não ganha registro na língua do Outro social.
Em “Na errância do “menino de rua”, um ato inventivo do sujeito”, Paula de Barros e Christian Hoffman seguem com as preocupações abordadas nos textos anteriores, tensionando a premissa de vítimas ou culpados e discutindo a errância do adolescente em situação de rua e a instituição como possível ponto de ancoragem. A relação infração- sujeito adolescente é tematizada neste Dossiê e atravessa muitos artigos, consistindo, a partir das intervenções junto à socioeducação, em fértil campo de discussão. A oficina de rap (Ritmos, adolescência e poesia) é o espaço a partir do qual Rose Gurski elabora acerca das possibilidades de diálogo entre psicanálise e socioeducação no texto “ A escuta de jovens “infratores”, o rap e o poetar: deslizamentos da “vida nua” à “vida loka”. O conceito de experiência em Walter Benjamin é articulado às posições dos sujeitos adolescentes com o que Agamben conceitua sobre o “homo sacer” e a “vida nua”. Iniciando com a problematização sobre políticas públicas direcionadas a adolescentes, Sandra Torossian, Maria Ribeiro, Thiago da Silva e Marcos Rafael Barbosa estendem a discussão sobre o adolescente em contexto de socioeducação, privilegiando o caso como norteador da ética da psicanálise.
Aline Souza e Doris Rinaldi em “O que a clínica da adolescência nos ensina sobre o ato?” e Juliana Marcondes Souza e Jacqueline Moreira em “O mal-estar na civilização e medidas socioeducativas: estudo do sentimento de culpa” se debruçam, respectivamente, sobre os conceitos de ato e culpa, ratificando o ato do analista como insturador da possibilidade de fala do adolescente. Roberta Silva e Leônia Teixeira, tomando as concepções teórico-clínicas de Freud e Winnicott, discutem o traumático a partir da vivência de abuso sexual. Como arremate às discussões, o artigo “Escolha profissional na adolescência: um estudo psicanalítico” de autoria de Juveneide Costa, Cynthia de Medeiros e Cynara Teixeira, articula as dificuldades que envolvem a escolha profisisonal pelo adolescente aos determinantes psíquicos, destacando as identificações nesse processo.
Este Dossiê é um testemunho de que a psicanálise é implicada com o sujeito que padece, ratificando sua posição não ortopédica, acolhedora do pathos que constitui a todos.
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